TRILHA SONORA RECOMENDADA
I
A fragilidade do homem e a supremacia dos lugares de poder
Durante anos evitávamos a rua, criando opções.
Meu pai era construtor, mas não lembro bem o título que tinha no papel. Construía
coisas para casa, remendava móveis, reparava o que quebravam e, quando sobrava
tempo, criava. Suas remendas e criações eram bem infantis e precárias, variando
de rústicos brinquedos a acentos e mobiliários esquisitos que não duravam muito
tempo. Lembro, como se fosse hoje, do forte cheiro de cola que tinha o cantinho
de meu pai. Era um cômodo pequeno e apertado, cheio de coisinhas: serras,
martelos, pregos, parafusos de tudo quanto é tipo e muitas coisas. Umas completas,
outras pela metade, ele tinha ali o seu espaço de criação. Naquele mundinho era
Deus. Mas era o Deus mais bagunceiro que eu conheci. Não tinha muito jeito
para a coisa. Quase sempre não se encontrava em seu canto. Vivia reclamando que
tinha aquela função por uma imposição, quase que medieval e divina, de seu pai
e seu avô. Ambos foram marceneiros. Os melhores. Ambos trabalharam duro para
garantir a casa que morávamos. Ofereceram o cargo ao meu pai, mas esqueceram de
lhe dar a habilidade e os atributos. Ele reclamava.
Levantava cedo e ficava naquela salinha.
Quando não íamos à escola por algum motivo, via sua rotina, quase que
sonolenta, de trabalho. Com um cigarrinho no canto da boca, roupas de ficar em
casa, ele acompanhava o mundo em um rádio mal sintonizado, mantinha-se acordado
com um café amargo e ia, vagarosamente, arrumando aqui, arrumando ali. Não tinha
muito serviço, então fazia o tempo render. E ele fazia isso para ter o que
dizer na hora do jantar. Para ter como maldizer pessoas que viviam nas ruas sem
função. Porque ele, ele ficava naquela salinha mal iluminada oito horas diárias,
contadas no relógio. Produzindo, dizia. Trabalhando, dizia. Com o foco ali. E
aqueles vagabundos que viviam nos botequins queriam, para meu pai, a vida fácil.
A vida da vadiagem. Ele sempre os pegava de exemplo. Minha mãe dizia:
- Seu pai sempre precisando de um Cristo.
E meu pai reclamava. Mas não reclamava só
de sua condição de marceneiro. Seu verbo soava análises sobre o mundo. Às vezes
o tinha como um cientista. Entendia de tudo. De todos os assuntos que apareciam
na televisão. E ele falava com propriedade. O assunto estava na ponta da língua.
Se estivesse no lugar de todas aquelas pessoas que comandavam as coisas, o
mundo seria muito melhor. Certeza que seria. Eu me perguntava, vendo-o muitas
vezes exaltado com a caixa preta, porque é que as pessoas não davam ouvidos para
o meu pai? Se elas o escutasse, aqueles problemas todos que eram noticiados não
estariam acontecendo e teria mais espaço na televisão para passar coisas
legais. Eu gostava de desenhos. Os desenhos que meu pai também criticava. Ele
dizia que o desenho transformava a gente em paquiderme. Não deixava a gente
sair pra rua e exercitar o corpo. Deixava a gente burro, porque ninguém
sobreviveria a uma rocha na cabeça. Deixava a gente viadinho, porque não era
legal chorar com a quarta morte de seu personagem japonês favorito. E ele tinha
outras queixas a fazer com o mundo. As diárias. Aquelas que se repetiam, às
vezes, quase que duas vezes por dia. Era a crítica direta, na forma com que
ele, o mundo, entendia as coisas. Porque naquele tempo, tudo que precisávamos
conseguíamos a partir de um acordo de trocas. Eram acordos de serviços, como
chamar uma moça em casa para passar roupa, permissões, como deixar minha mãe
sair e voltar com várias sacolas de sapatos, joias e maquiagens, ou homenagens,
como presentear a mim e a meu irmão com brinquedos e passeios. Chamavam, no
costume, o acordo de lucro, dinheiro. E o dinheiro era um vilão para o meu pai.
Para ele, aquele acordo de troca era muito desigual. Meu pai tinha que
consertar e criar em grandes quantidades para conseguirmos coisas triviais do
dia a dia. E isso ele sabia amaldiçoar como ninguém. Porque ele não era bom em
consertar, todo mundo sabia disso. Aí ele tinha pouco serviço. Aí ele amaldiçoava
o pai e o avô. Aí ele amaldiçoava o tempo, porque já não dava mais para ele ser
outra coisa. Então, vivíamos num fogo cruzado, na corda bamba do mundo. Escolhíamos
um dia do mês para certas atividades, como por exemplo, comer o que todos
comentavam, assistir a um filme que todos assistiram, ir a lugares que todos
iam, desde que não exigisse uma locomoção muito complicada e que pudéssemos
chegar com a resistência de nossas pernas.
Certa vez, vimos na televisão um novo
sanduíche que vinha com um brinde de presente. O brinquedo em si era de péssima
qualidade, dizia meu pai, assim como o lanche, dizia meu pai, mas a publicidade
transformava aquilo tudo em uma terrível tentação, dizíamos nós, com outras
palavras. Eu e meu irmão mais novo, sempre que víamos a propaganda gritávamos
pela atenção de minha mãe, que calma como sempre, nos dizia, seu pai não tem
dinheiro, espera o fim de mês. E queríamos. E atormentávamos. Até que em um dia
de um mês, meu pai anunciou para nós:
- Vamos ao Shopping comprar esse diacho de lanche.
Andamos por duas horas. As horas foram contadas
no meu relógio de pulso, batendo com o do meu pai. Saímos de casa às 11:00. A
caminhada era longa, com declives de subidas e descidas. Raramente eu olhava
para frente. Tinha a mania de caminhar apreciando o que já fora. Admirava
demais cada detalhe da vida urbana: pessoas esparramadas no chão, de qualquer
jeito. Homens com pressa. Mulheres com pressa. Esbarrões sem desculpa. Uma moça
que conversava, histérica, ao celular. Um rapaz que bebia um refrigerante e
mastigava um hambúrger, enquanto andava. Outro que corria para pegar o ônibus e
amaldiçoava o motorista, por ter se atrasado cinco segundos e o ônibus partir
sem levá-lo. O que mais me espantou foram os senhores e crianças que passavam
pedindo dinheiro para o meu pai. Eram pessoas de tudo quanto é jeito, que eu
nunca tinha visto em lugar nenhum. Um homem tinha parte da face deformada, o
nariz torno, a boca virada, poucos dentes. Grunhia algo que só era entendido
mesmo devido aos gestos que fazia. Uma criança magra, suja, com escoriações na
face e no corpo. Um garoto ainda mais novo, ainda mais sujo e ainda mais magro,
imitando o gesto. Me espantei com a crueldade que meu pai os tratara. Um garoto
se referiu a meu pai por senhor:
- Senhor ajuda eu com uma moedinha, pra comer?
Meu pai, que teve que esperar quase um mês
para nos permitir um lanche feliz, respondeu:
- Porque teu pai não arruma um emprego, hein? Vai, vai. Some daqui!
Era isso. O menino ficou lá, murmurando palavras que fizeram meu pai
olhar pra trás e o garoto correr de medo. E todo mundo fazia exatamente a mesma
coisa. Ninguém os via. Somente os enxergavam como obstáculos no trajeto.
Desviavam e quando a abordagem era inevitável, embruteciam, xingavam, davam de
ombros. Talvez fosse uma verdade que ninguém queria engolir: aquele mundo tinha
gente em condição de morto-vivo. Aquelas pessoas andavam com a repugnância de não
saberem, ao certo, se viviam, morriam ou morto-viviam. Mas eles tinham
intererassões interessantes um com o outro. Brincavam, riam, xingavam. Tinham
cachorros também. Os cachorros e os meninos. Os velhos. Todos de Graciliano.
Andavam pomposos, latiam, entravam na brincadeira. E quando tinham que correr,
corriam. Unidos, se espalhando como formigas em formigueiro. Enquanto andávamos
vimos um casal distraído. O homem andava com a carteira aparecendo no bolso de
trás. Um garoto correu e pegou. Atravessou a rua como um jato, forçando
freiadas bruscas. O ex-dono da carteira foi atrás, mas mal começou a correr,
veio um maior e lhe deu um encontrão, o forçando perder o ladrão de vista.
Depois esse também correu, sumiu, como bala, em outro sentido. Era muita gente.
Ninguém preocupada com mais um desavisado que perdia a carteira.
Tudo isso me forçava a andar olhando para o pé, para trás, para os lados,
menos para a frente. Raramente para frente. Até que chegamos em um salão
monumental, com portas imensas. Um castelo, como víamos nos desenhos e filmes.
Mas lá morava muito mais gente. E circulavam muito mais pessoas do que nas
ruas. Contudo, percebi que as pessoas escolhiam as roupas para a ocasião. A mudança
da rua para o castelo era gritante. Aquele lugar pedia que você usasse sua
melhor roupa, a mais bonita. Claro, se todos fossem lá com a mesma frequência
que nós íamos, aquele era um momento especial. Especial para todos nós. As
pessoas andavam muito bonitas e, aparentemente, felizes em vestirem-se daquele
jeito. Uns exageram muito na escolha. Vi um rapaz com os cabelos verdes,
espetados e pra cima, junto de um grupo com cabelos ainda mais esquisitos.
Vestiam couro, botas grandes, e quando passaram por nós meu pai os olhou com
aquela cara de quem olha alguém para arrumar encrenca. Todos ignoravam todos.
Um homem me viu porque o esbarrei no calcanhar. Ele grunhiu um nome alto de dor
e, quando me viu, brincou com meus cabelos e foi embora. Continuamos andando,
avançando ainda mais naquele monumento que meu pai chamara Shopping Center.
Shopping Center do cassete.
Tinha três galpões um em cima do outro. O acesso era por escadas que
giravam sozinhas. Em cada galpão, várias casas com pessoas fazendo trocas uma
com as outras. As pessoas que vinham para passear, tal qual nós, eram muito
exigentes com as trocas. Passavam horas e horas olhando os objetos por trás de
um vidro e não adquiriam nada. Minha mãe era uma delas. Ficou horas admirando
uma bolsa, que parecia muito com a que estava no ombro, mas não a trocou. Ao
seu lado, uma senhora com cabelos loiros, volumosos, parecia o palhaço que fazia a propaganda do meu lanche. O dela
era amarelo. Tinha pérolas grandes nas orelhas, óculos escuros que lhe cobriam
quase que os olhos, a testa e as bochechas. Aqueles visores lhe garantiam a
arrogância de seu portar. Não se sabia ao certo para quem ela olhava, mas sabia
quem ela esnobava: a todos. O homem responsável por todas aquelas mercadorias,
ou bostas, como dizia meu pai, aproximava-se da senhora e era despachado com
grosserias e palavras breves. Ele, me admirando, insistia no contato e ela
tornava a distanciá-lo. Até que fora vencida pelo cansaço. Com petulância,
pediu ao homem que descesse pilhas e pilhas de calçados e levou, dentre todos,
um. Minha mãe namorou todos os pares que aquela senhora fantasiada
experimentara. Meu pai, vendo que minha mãe desejava tanto aquele objeto, fez o que
sempre fazia: nem sequer um esforço para ser gentil. Ficara com o olhar acabrunhado,
reclamando de tudo, meditabundo em seu mal-humor. Quando ela lhe exteriorizou o
desejo, tudo que fez foi lhe olhar. Ignorou e pediu que fôssemos andando. Senti
vontade de pedir a mulher fantasiada que desse um dos pares a minha mãe, já que
ela desprezara tantos, mas meus pais ficariam bravos, chiliquentos, e, como das
últimas vezes que tive esse ímpeto, receberia uma surra. Então andamos. Vimos
mais vitrines, minha mãe se encheu ainda mais de desejo e meu pai de introspecção.
A cada loja, um comentário, a cada comentário, um silêncio. Reparei também que
a cara do meu pai combinava muito com a cara de outras pessoas naquele
ambiente. Todas pareciam encher-se de um gozo transbordante e transcendente e,
em seguida, voltar-se a si com uma rabugência da impossibilidade. Todos
precisavam muito de tudo que viam ali. Se conformavam em não ter. Os objetos
eram para exposição. Os objetos eram para poucos, premiados e sortudos.
Contudo, a exposição era suficiente para muita gente. Principalmente para minha
mãe. O prazer entre a posse e o desejo da posse era o interessante naquilo
tudo. Como na vez em que minha mãe namorou durante horas um perfume que uma moça
passava vendendo de casa em casa na minha rua. Foram semanas falando da fragância,
do frasco, do preço e até dos benefícios daquele objeto. Meu pai, não
aguentando mais tanta indireta, comprou o perfume. Minha impressão era que
minha mãe acabaria com o líquido em dois dias. Comemorasse a conquista do tão
sonhado perfume com festividades e mostrasse a todos o que conseguiu. Mas não.
Por dois dias sentimos o cheiro perfumado em seu corpo. No terceiro, ela
deixou-o de canto, para enfeitar a penteadeira. No quarto dia já tinha desejo
por outras coisas. O perfume só serviu mesmo foi de argumento para o meu pai,
quando minha mãe pedia alguma coisa.
Andamos por, mais ou menos, vinte minutos. Notei que,
involuntariamente, até meu olhar já era perturbador e pedia clemência por um
lugar para sentar e um prato de comida. Todos estávamos cansados. Exceto minha
mãe. Ela não se exauria em desejar o que jamais teria. Gostava de apreciar
tudo, desde os badulaques mais inúteis até aneis, colares e brincos com o valor
de três, quatro, cinco dígitos que jamais alguém o usaria. Meu pai dizia serem
adereços de pavão, para tudo que minha mãe via. Quando chegamos no limite de
nossos pés, estômago e paciência, meu pai disse, vamos comer. Parecia que minha
mãe tinha recebido um golpe naquele momento. Um golpe que lhe ofendera sete
gerações familiares. Ela fechou a cara e caminhou distante, mesmo ao lado de nós
e de meu pai. Percebi que meu pai ganhara uma parceira para sua rabugice. Ao
longe, conforme andávamos no último andar do Shopping, avistei o símbolo que víamos na televisão, o lugar que
vendia o lanche feliz. Eu e meu irmão corremos na frente. Notei que outras
crianças faziam o mesmo. Ao chegar perto do local, um susto. Nunca vi tanta
gente junto. Era um salão pequeno, com um balcão e por trás dele, a cozinha
onde as pessoas faziam os sanduíches. Não vi nenhum desenho animado pululante
fazendo graças em aventuras. Preferi, de cara, meu lanche da televisão. A recepção,
a alegria, o conforto e até o desejo de consumir o que divulgavam era muito
maior do que na vida real. Do balcão até meu pai tinham cerca de, na minha
perspectiva, umas trinta, quarenta pessoas. Demoramos mais vinte minutos para
sermos atendidos e aquilo nos fatigou todos. Pedi, pedimos para irmos embora,
mas meu pai, brutucu de nascimento, nos fez ficar por lição:
- Vocês querem é me deixar louco! Com tanto trabalho, me fizeram sair
de casa. Agora vão engolir essas porcarias de lanches goela abaixo!
Na nossa vez, meu pai pediu dois lanches felizes - um para cada filho
da família. A garota que nos atendia vestia um uniforme engraçado, colorido,
com boné e alegria. Seu semblante era de uma pessoa stressada. Quando meu pai
perguntou quanto era, ela o olhou com carranca e disse:
- Cinquenta reais.
Por alguns minutos meu pai pareceu congelado. Aquele
semblante que já sabíamos identificar nele. O olhar de consciência, a epifania
do impulsivo. Ele não tinha consultado o preço dos lanches. O fato de ser
sempre impulsivo era o principal defeito de meu pai. Era um homem de impulsos
em sua calma e em sua ira, em seus anseios e em seus desejos. Raramente
racionalizava o mundo. O meu pai era movido pela emoção da pressão arterial.
Quando se dava conta de que faltara a racionalidade de um planejamento, mínimo
que fosse, como por exemplo consultar o preço de um sanduíche, ele nos admirava
com aquele semblante de desrumado. Eu já sabia reconhecer o semblante e os números, pois ele me ensinava
em casa, sempre que dava. Na mão dele tinham três notas de dez. Era isso mesmo.
Três notas de dez. Três vezes o número dez, segundo meu pai, era trinta.
Precisava de mais duas daquelas. Ele as segurou entre os dedos, quase que
frouxamente. Se um esperto passasse naquele momento, tiraria a sorte grande.
Ele olhou para minha mãe, minha mãe o olhou complacente. Ele nos olhou, guardou
as notas e disse:
- Vamos sentar ali um pouquinho para eu pensar.
Nos sentamos em um banco de frente para a lanchonete. Minha mãe
segurou meu irmão no colo e eu fiquei ao seu lado, quieto. Meu pai começou a
andar e conversar com as pessoas da fila. Não entendi muito bem o que ele
dizia, mas abordava alguém e com um olhar muxoxo, falava, nos apontava e falava
de novo. Uns o ignoravam, o tratavam com rispidez. Me lembrei do percurso de
casa ao Shopping e percebi que ele faria a mesma coisa se visse a si mesmo
naquela situação. Até que um casal de senhores, ao nos avistar quando meu pai
nos apontou, gesticulou para que eu e meu irmão chegássemos perto dele.
- Eu pago seu lanche, filho. Teu pai pode guardar esse dinheiro para
voltar de ônibus com vocês.
Eu dei-me por satisfeito. Fiquei feliz. Sorri. Meu pai estava era
vermelho. Nunca o vi daquela cor e nunca o vi tão desejante de tornar-se invisível.
Mesmo porque, se a rua fosse a moradia de um nada, ser pedinte era o ofício
daqueles subjulgados por meu pai. Daí então, sim, comemos o lanche feliz tão
esperado, ganhamos o brinquedo que tanto queríamos e voltamos para casa. De ônibus.
Tudo parecia perfeito demais para eu e meu irmão, mas meu pai e minha mãe
voltaram emudecidos. Nem se falavam. Só se olhavam, nos olhavam, resmungavam.
Ficaram ali, mas em outro lugar. O humor deles fora tão contagiante que eu
decidi, em acordo com meu irmão, nunca mais pedir nada daquelas coisas para
eles. Se fosse para nós sorrirmos e eles ficarem daquele jeito, era melhor que
a gente aguentasse a tristeza, porque eu sabia qual era o limite da minha ansiedade,
dentro de mim. No outro, a tristeza doía muito mais. Mas éramos crianças. Era
difícil controlar a ânsia do desejo. Principalmente do desejo consumista de
vermos na televisão e no corpo dos outros, coisas que dificilmente teríamos a
chance de ter ou usar. Era muito complicado nos acostumarmos a não termos um
computador, um tablet, um video game de última geração. Mais complicado ainda
era admitirmos a impossibilidade para os outros. Nos assumirmos atrasados a
toda uma tendência daquela humanidade que nos olhava, nos julgava e nos formava
era admitirmos incapazes, ineficientes para constituí-la. Era como se, em um
mundo de maratonistas, todos andassem e nós não tivéssemos pernas. Corríamos
como podíamos, com as mãos arrastando o tronco do corpo, com cotoquinhos de
pernas murchas. Não adiantava nem sonhar em ter a mesma velocidade que os
outros. Ficávamos para trás mesmo. Aproveitávamos a tendência do mundo passado,
no tempo presente. Jamais nos acostumaríamos com aquilo.
continua na próxima postagem, em 11/05/14
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